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Carta ao Vice-Presidente da República Federativa do Brasil

Ao Exmº Sr.

Michel Temer

DD. Vice-Presidente da República Federativa do Brasil

São Paulo, 12 de dezembro de 2013

Exmº Sr. Vice-Presidente e Comendador do Trono Patriarcal Antioquino.

Cordiais saudações e Bênçãos Apostólicas.

É com o espírito de alegria e paz que nos traz nosso Senhor Jesus Cristo, o Salvador, com seu nascimento na humilde gruta de Belém, que saudamos Vª Exª e digníssima família, e, em sua pessoa, a todas as autoridades governamentais deste tão querido país, rogando ao Divino Infante que faça florescer a paz e a alegria, não somente no Brasil, este hospitaleiro país, mas nos corações dos homens e mulheres de todo o mundo, que são a família de Deus na terra.

É do conhecimento de Vª Exª que a cada dia 10 de dezembro o mundo comemora o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Tendo isso em mente, nestes dias em que nos preparamos para celebrar o Santo Natal, nos lembramos das palavras de Vª Exª, de seu carinho e preocupação por implementar a paz e reconciliação, com a observância dos direitos humanos, na Palestina, de maneira especial, e em todo o agora sofrido Oriente Médio, razão, dentre outras, pela qual aproveitamos o ensejo para expressar nosso apreço e consideração por sua digna pessoa, dirigindo-lhe, e através de Vª Exª às demais autoridades brasileiras, esta carta, com o manifesto desejo de, igualmente, nos esforçar e lutar, por todos os meios, para que haja a verdadeira paz na vida de todo o povo do Oriente, para que, assim, o Santo Natal tenha sentido e especial significado em suas vidas.

Sr. Vice-Presidente.

Quando do nascimento, na carne, de Jesus Cristo, há aproximadamente dois mil anos, os anjos do Céu anunciaram este grande acontecimento com um cântico que resumiu a mensagem de júbilo e paz do Natal: “Glória a Deus nas alturas e na terra paz, boa vontade entre os homens.” (S. Lucas 2,14). Isto porque o Natal é a celebração da descida do Príncipe da Paz para nascer na terra, entre os homens, e, assim, reconciliar, com a paz que ele nos traz e quer transmitir, o Céu e a terra, as criaturas com seu Criador, para que esta paz reine entre os homens de boa vontade.

Neste tempo abençoado as palavras “paz” e “alegria” são ditas e repetidas muitas vezes em todo o mundo, em todos os idiomas, por homens e mulheres, grandes e pequenos e pelos anjos no Céu.

E nós perguntamos: como podemos ter a alegria e paz do Natal enquanto não há paz no berço do Cristianismo, Líbano e Síria, e na Palestina, lugar do nascimento do Príncipe da Paz? Como nós, filhos do Oriente, podemos celebrar o Natal com alegria e paz enquanto o Oriente está sendo queimado pelo fogo do terrorismo e destruição?

Como nossa comunidade sírio-libanesa no Brasil pode celebrar a paz e alegria do Natal? São mais de doze milhões de pessoas sofrendo por sentirem nos corações tudo que acontece tão injustamente em sua terra de origem, onde seus familiares e parentes são decapitados, mortos violentamente e outros tantos estão desabrigados?

Como nos alegrar pela paz do Natal com dois Arcebispos, D. Boulos (Paulo) Yazigi , de nossa Igreja Antioquina, e D. Youhanna (João) Ibrahim, da Igreja Sírio-Ortodoxa, sequestrados já há nove meses, sem que se tenha deles qualquer notícia, sequer se ainda estão vivos? Isso sem contar os Padres que estão cativos no norte da Síria, em situações que nos são desconhecidas.

Como podemos ter e comemorar a plenitude da paz do Natal de Cristo se há duas semanas treze freiras ortodoxas foram sequestradas de seu convento de Santa Tacla em Maaloula, na Síria, a única cidade em todo o mundo na qual ainda se fala o aramaico, o idioma usado pelo próprio Jesus? Estas religiosas foram levadas à força, de seu convento, e aprisionadas em local desconhecido, sendo que sua missão religiosa sempre foi cuidar de órfãos abrigados junto ao convento e acolher os visitantes da igreja e convento, sendo estes últimos cristãos das várias Igrejas e também membros de outras religiões. Elas nunca tiveram nem têm armas para se defender e às suas crianças, a não ser sua fé e a oração diuturna pela paz e salvação do mundo.

Excelentíssimo Sr.

Sua Beatitude Youhanna (João) X, nosso Patriarca, juntamente com outros líderes cristãos, bem como Metropolitas de nossa Igreja, não deixam, por um minuto que seja, de se preocupar e ocupar, dia e noite, por todos os meios possíveis e através de contato e solicitação a todas as autoridades políticas, indistintamente, em saber o destino dos sequestrados e lutar por sua libertação, mas, infelizmente, até agora, apesar das promessas de auxílio, todos estes esforços têm se mostrado infrutíferos.

Os fiéis, nas Arquidioceses assim diretamente afetadas, estão à espera do retorno de seus Arcebispos e Sacerdotes, e o histórico convento de Maaloula foi quase destruído, e nele se ouve agora lamento e choro pela perda das religiosas, ouvindo-se o som de disparos e bombardeios, com o cheiro da pólvora, no lugar das vozes em cântico e oração e do badalar dos sinos, com o suave odor do incenso.

Em muitas cidades e aldeias cristãs os habitantes foram expulsos de suas casas, as quais foram saqueadas e destruídas.

Nós sabemos, Sr. Vice-Presidente, que o Brasil está entre os primeiros países na luta pela defesa dos chamados “direitos humanos”, esta declaração de valor mundial, da qual, como já dito, nos lembramos anualmente em 10 de dezembro. E ficamos nos perguntando, diante destes tristes e lamentáveis acontecimentos e do silêncio e inação de muitos, pelos direitos dos seres humanos inocentes, de paradeiro e sorte ignorados, de que aqui falamos. Onde estão seus direitos, especialmente daqueles que trabalham desinteressadamente em prol e a serviço da humanidade, como os Bispos, Padres e freiras?

Eles são membros da família de nossa pátria, nossos irmãos no Oriente.

Eu, pessoalmente, apesar de sírio por nascimento, sou também libanês, não só por ter, oficialmente, a cidadania libanesa, mas também pelos anos de estudos e vivência naquele país, bem como me orgulho de ter a cidadania brasileira há mais de dezoito anos, e sinto-me honrado por pastorear incontável número de nossos filhos sírios e libaneses e seus descendentes, e outros, que vivem, trabalham e estudam no território de nossa Arquidiocese em solo brasileiro.

E é em nome de todos os árabes radicados no Brasil e de seus descendentes, igualmente orgulhosos de sua pátria mãe e da cidadania brasileira, que nos dirigimos a Vª Exª, como membro que é desta grande e nobre coletividade e filho desta pacífica pátria brasileira que tanto respeita a liberdade e os direitos de todo ser humano, e que goza, assim, do respeito e confiança de tantas outras nações, que pedimos-lhe ajuda, com toda a autoridade moral e legal de que está investido, e segundo a generosidade de seu coração, no sentido de interceder pelo fim do banho de sangue e de toda a destruição que assola as milenares civilizações da Síria e Líbano; que possam ser salvos, por todos os meios possíveis, da enorme barbárie e dos terroristas, inclusive mercenários estrangeiros, que lá estão agindo, com a libertação dos sequestrados, clérigos e leigos, e sua devolução, sãos e salvos, às suas famílias e comunidades de fé.

Sua Santidade, o saudoso Papa João Paulo II, quando de sua visita oficial à Síria, declarou ser aquele país o berço do Cristianismo, do qual a fé cristã se expandiu para o resto do mundo.

Nossa esperança é que quando, finalmente, pela graça de Deus e a ação de homens de boa vontade como Vª Exª, cooperando entre si e unindo forças na luta pela paz, chegarmos à concretização desse tão sonhado e almejado ideal, com o fim do terrorismo, secadas as fontes do mesmo, sendo afastado esse terrível mal daquela terra e de todo o mundo, a Síria se tornará, então, recanto e divulgadora da paz, paz que reine em todo o mundo civilizado e proteja a dignidade do ser humano, o qual foi criado por Deus para a vida, e não para a morte.

Aí, então, poderemos realmente nos alegrar com o Santo Natal de Cristo, que é festa de paz, alegria e bondade nos corações humanos, e não uma celebração na qual estejam presentes tristeza e dor pelos irmãos que sofrem.

Desejamos, de coração, que a paz celestial, a verdadeira paz do Natal, tão incompreendida neste mundo, tenha especial lugar em seu coração e nos de seus entes queridos.

Finalmente, Exª, pedimos desculpas por assim incomodá-lo, mas, nos momentos de sofrimento, abrimos nosso coração a quem prezamos e em quem confiamos, certos de seu carinho e sinceros esforços pelo bem para todos, pela paz e valores e direitos humanos, desejando que, ao final, como é vontade do próprio Deus, o júbilo e a paz dominem todos os corações.

Queira ele, nosso Pai Celestial, assistir Vª Exª em sua vida pessoal e no cumprimento da missão que lhe foi confiada pelo povo brasileiro, abençoando-o e a todos que lhe são caros.


Reiterando nossa estima e consideração:

D. Damaskinos Mansour

Arcebispo Metropolitano Ortodoxo

da Arquidiocese de São Paulo

e todo o Brasil

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